terça-feira, 23 de março de 2010

Luiz Alves Patrimônio histórico


Capela da Soledade

Correi, famintos tropeiros,
De pé, garimpos de dor,
Levai célebre vosso ouro
À capela da Solidão.
Figo da Estrada Real,
Dos seus vorazes fiscais.
Depressa, rumai ao desvio,
À estrada da Solidão.

Guardai o vosso tesouro,
Que é fruto de sangue e suor,
Produto de garra muita,
E filho de muita sezão.

Cá em cima a paz da capela,
Lá em baixo o velhas espera.
Pra frente, mineiros, vos vela
A Virgem da Solidão

Capela de Santo Antônio do Pompéu



Casamentos, mil noivados,
Namoricos, namorados...
Pobre Antônio...
Quer a paz do ar cheiroso,
Das cigarras, dos regatos.

Pega as malas, cai na estrada.
Entre anjinhos bem gorduchos
E florinhas mil douradas,
Corre aflito e se esconde
Na capela do Pompéu.

 
Chafariz do Kaquende

Ah, as águas escorrem
Das goelas do Kaquende...

Donde vêm, aonde vão?
Minam as sedes, escondem demônios?
Enfeitiçam e obrigam a volta?

Lá estão elas
Salutares, centenárias.
Gela o frio, queima o sol,
Em igual temperatura.

Lá vão elas,
Em sábia frieza,
Em líquida indiferença,
Se cumprindo



Igreja das Mercês

Não apenas as igrejas
Que torneiam com o ouro.
Não apenas a imagens
Torneadas com esmero.

Não o Deus onipotente,
O terrível Deus juiz,
O senhor de horrendas pragas,
Das trombetas, dos trovões.

Precisamos de algo assim
Tal o Deus da manjedoura.
Que sua rela pobreza
Bem desnudo se nos mostre.

Um local onde fiquemos
Tão humildes, tão mesquinhos,
De cuidados à mercê.

Algo assim,
Pureza e graça,
Bem Igreja das Mercês


Igreja do Carmo

Dentro da Igreja do Carmo
Os púlpitos conversam.
Jovem rico, humilde samaritana
Falam do ouro que escraviza,
Das duras marcas do preconceito.
Simão Stock e São João cruzam olhares
E neles tanta cruz por Santos ideiais.

Os atlantes suportam as dores do mundo.

E em todos eles a marca do Mulato,
Essa angústia que se arrastou pela vida
E arrancou,
De bruteza da pedra,
A dolorosa beleza
Que teimava em lá se esconder.



Igrejas de Ravena

Cuidado, afoito viandante,
A serpente-estrada ameaça.
Mil carros, mil curvas vorazes.
Cuidado, a vida é fugaz.

Desvia a rota e busca
Na paz de Ravena o descanso.
Sustém a sanha de ir.
Viver não é apenas chegar.

Coloca a alma em sossego,
Embriaga-te ali com a paz.
Duas pérolas barrocas te aguardam.

A estrada pode esperar.

 



Matriz de Nossa Senhora da Conceição
Tua grandeza me assusta,
Tua riqueza me oprime.
Conchas, volutas, capitéis,
Ouro, ouro, muito ouro.

Minha Senhora,
Cuida da minha pequenez,
Perdoa meus pobres limites,
Tolera minha mesquinhez.

Magnética, magnífica, magistral!
Tua casa nos espanta e abobalha.
Aqui todos nos sentimos servos,
Serventuários, servidores, serviçais.

Bem mereces, magnânima Senhora.
Nela Explode toda a tua realeza.
Mais que todas, na Matriz é que se vê
A morada majestosa da Rainha.


 
Nossa Senhora do Rosário dos Pretos


De escravos erguida.
Atrevidamente
No meio da cidade
Afrontando a branca arrogância.

Inacabada?
Em construção!
Apenas parada,
Tomando impulso
Para um salto que vai
Muito além da realidade da pedra.

Dura ferida que se mostra.
Denúncia viva.
Metáfora a gritar,
Em rudes pedras
Velhas chagas expostas.

A saga de uma gente
Cuja história
Inda está por terminar.




 


                                                                                Luiz Alves



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